27/07/2010

Como a indústria saiu da turbulência

Por Caio Cigana

Com a recuperação da indústria e o avanço da construção civil, o Rio Grande do Sul registrou em junho um total de 2,29 milhões de pessoas empregadas com carteira assinada na iniciativa privada. O número é 8,8% superior ao de igual mês de 2008, no período pré-crise, quando o país e o Estado atravessavam um fase de atividade econômica acelerada até a quebra do banco norte-americano Lehman Brothers, no dia 15 de setembro data que assinala o início da crise financeira global.

A reação do mercado interno começou em 2009, com medidas de incentivo ao consumo, ao investimento e às exportações para segmentos importantes da matriz econômica do Estado, como os de móveis, máquinas agrícolas, calçados e construção civil. Esses setores foram analisados por Zero Hora para mostrar como estavam na fase mais aguda da crise e como estão agora. Dos quatro segmentos, apenas o calçadista ainda não conseguiu recuperar a massa de empregos do início do segundo semestre de 2008. Sem depender do mercado externo, a construção civil é o que apresenta o melhor desempenho. De agosto de 2008 a junho deste ano, teve saldo líquido de 22,5 mil novos empregos.

O desempenho fraco no mercado externo é o entrave para um crescimento maior da indústria gaúcha e a contratação de mão de obra. Para o economista Paulo de Tarso Pinheiro Machado, diretor técnico da Polo RS Agência de Desenvolvimento e da Agenda 2020, o maior gargalo são as deficiências logísticas do Rio Grande do Sul, que elevam custos de transações e tornam ainda mais difícil para as empresas gaúchas a colocação de seus produtos no Exterior em épocas de demanda desaquecida.

Calçados: a passos lentos

Ao contrário da construção civil e das indústrias de móveis e máquinas agrícolas, os calçadistas gaúchos ainda não conseguiram repor as vagas fechadas entre 2008 e 2009. Mesmo com um saldo positivo de 9,2 mil empregos este ano, a mão de obra do setor no Estado é 4% menor em comparação com agosto de 2008.

Os entraves estão fora das fronteiras brasileiras. Um deles é a demanda externa ainda fraca, o que se reflete na continuidade do movimento de queda das exportações gaúchas. O outro é a China, responsável por mais de 90% dos calçados importados que entram no mercado brasileiro. A sobretaxa imposta aos produtos chineses em setembro do ano passado conteve esse ingresso, mas a indústria brasileira reclama agora da prática de triangulação com outros países da Ásia para driblar a medida antidumping.

Apesar da demanda reativada no mercado interno nos últimos meses, o diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados, Heitor Klein, vê a possibilidade de um repique da crise na Europa, o que tenderia a atrasar por pelo menos dois semestres a retomada das exportações gaúchas. Em número de pares, as vendas do Rio Grande do Sul ao Exterior caíram 11% no primeiro semestre – após retração de 31% em 2009 e de 26,3% em 2008.

– Não estamos seguros de uma recuperação plena – diz Klein.

Construção civil: vitória no andaime

A crise arrefeceu o ímpeto do brasileiro de comprar a casa própria, mas o impacto na confiança teve uma influência reduzida nos índices de atividade da construção civil gaúcha. Apesar da freada no número de lançamentos de novos imóveis, o setor teve de manter o ritmo para construir e entregar as casas e apartamentos vendidos nos dois anos anteriores.

Com a manutenção da oferta de crédito e o incentivo de programas como o Minha Casa, Minha Vida, criado para combater o déficit habitacional da população de baixa renda, a construção civil retomou a trajetória de alta. De agosto de 2008 a janeiro deste ano, o setor registrou criação líquida de 22,5 mil empregos e tem dificuldades para encontrar mão de obra qualificada.

O aquecimento do mercado fez o economista Marco Túlio Ferreyro, do Sindicato das Indústrias da Construção Civil (Sinduscon-RS), rever para cima três vezes as suas estimativas de geração de empregos em 2010 no Rio Grande do Sul. A projeção agora é criar 25 mil novos postos de trabalho. Até junho, foram 14,1 mil, conforme o Ministério do Trabalho.

A formação de uma bolha no mercado mobiliário é considerada pouco provável por Ferreyro. O economista lembra que, apesar da explosão de preços em algumas capitais, não são observados no Brasil sinais típicos como os verificados nos EUA, de pessoas comprando um segundo ou terceiro imóvel apenas para tentar lucrar com a especulação. Outro diferencial, lembra, é a gestão do governo sobre o risco do crédito com mecanismos como o Índice de Basileia, que mede a solvência dos bancos.

– Vejo menos sinais de bolha do que mais – afirma Ferreyro.

Máquinas agrícolas: salvação no mercado interno

Maiores fabricantes de máquinas agrícolas do Estado, as norte-americanas AGCO e John Deere demitiram cerca de mil trabalhadores entre o final de 2008 e o início de 2009. Prejudicadas pela retração do mercado interno, pela paralisação dos pedidos de clientes no Exterior e pela seca histórica na Argentina, principal destino das exportações gaúchas, as vendas de colheitadeiras praticamente pararam.

A reação veio em 2009 com o Mais Alimentos, programa de incentivo à mecanização da agricultura familiar, e o Programa de Sustentação dos Investimentos (PSI), com juros reduzidos para produtores. Dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) indicam que os fabricantes gaúchos produziram, até maio, 18% tratores a mais do que no intervalo equivalente em 2008.

– Hoje, estamos acima do pré-crise – diz o diretor de produtos da AGCO para a América Latina, Jak Torretta, que contabiliza no semestre um faturamento 10% acima do mesmo período de 2008 e um quadro de 2,6 mil funcionários, 90 a menos do que 2008.

Para Werner Santos, diretor de vendas da concorrente John Deere, apesar da retomada do nível de atividade, a tendência é frear as contratações.

– Devemos ter um La Niña (fenômeno que costuma causar seca no Sul do Brasil e Argentina) e não sabemos quem será o próximo presidente (da República) – pondera Santos.

Móveis: empurrão imobiliário

Atingida pela crise, a indústria de móveis do Rio Grande do Sul recuperou-se graças ao mercado interno e hoje emprega mais pessoas do que em agosto de 2008, mês que antecedeu o início da fase mais aguda da turbulência internacional. O setor foi beneficiado pela redução de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), que vigorou de novembro de 2009 a março deste ano, e ainda tem como mola propulsora o avanço da construção civil, já que cada apartamento ou casa entregue precisa ser mobiliado.

Do lado das exportações, porém, os negócios do primeiro semestre ficaram 30% abaixo dos de igual período de 2008. Estimativas da Associação das Indústrias de Móveis do Rio Grande do Sul (Movergs) indicam que as vendas externas do Estado chegarão a US$ 215 milhões, 25% abaixo de dois anos atrás. A compensação virá do mercado interno, mesmo com um desempenho tímido nos dois últimos meses creditado à Copa do Mundo e às fusões de grandes varejistas, que afetam a formação de estoques. Após uma queda em 2009, a indústria gaúcha deve faturar R$ 4,2 bilhões neste ano, ante R$ R$ 3,92 bilhões de 2008.

– Se as exportações estivessem iguais, não teríamos mão de obra e, possivelmente, haveria falta de insumos. Estamos com um apagão de mão de obra, do chão de fábrica a cargos de gerência – avalia o presidente da Movergs, Ivo Cansan.

Fonte: Zero Hora 25/07/2010

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