Crise da indústria brasileira vai muito além do câmbio
Editorial do jornal Valor Econômico
Reportagem publicada pelo Valor na segunda-feira revelou que um acúmulo de fatores mais e menos antigos conspirou para deprimir a indústria brasileira, especialmente o segmento de transformação, nos últimos anos.
Infraestrutura precária, custos elevados de mão de obra, carga tributária alta, spreads bancários turbinados em cima dos maiores juros do planeta e educação insuficiente são alguns desses antigos problemas que afloraram com toda intensidade quando a crise internacional acentuou a tendência de apreciação do real e aumentou a concorrência mundial.
Os custos da indústria brasileira vêm subindo continuamente. Conforme a reportagem registrou, a folha de salários da indústria aumentou 25% desde 2005 em reais, já descontada a inflação.
A energia elétrica, um importante indicador da infraestrutura, ficou 28% mais cara, apesar da abundância de recursos hídricos. Com a valorização do real, os custos tornaram-se ainda maiores. Em dólares, a energia saltou 86%, e a mão de obra, 57%.
Nesse espaço de tempo, o câmbio teve uma valorização de 40% em termos reais, frente a uma cesta de 15 moedas, que deixou a indústria brasileira com dificuldades de competir não só com a China, mas também com a Alemanha.
O impacto desses fatores na perda da competitividade da produção brasileira foi fulminante. Em 2004, a chapa de aço nacional tinha praticamente o mesmo preço da importada. Em 2011, o aço doméstico custava 75,5% mais do que sete anos antes e o importado subiu 38,2%.
O preço sem impostos da tonelada da chapa grossa de aço laminado brasileiro chegou a US$ 1.130 no ano passado, 31,9% mais cara do que a importada (US$ 857).
Em outro exemplo recolhido pela reportagem, o custo da mão de obra industrial no Brasil, de US$ 10,08 por hora, é um terço da verificada nos Estados Unidos e Japão, mas é maior do que a de países como o México, cuja indústria automobilística vem preocupando Brasília, e, naturalmente, do que o da China.
A produção industrial brasileira perdeu espaço não só no mercado externo mas também no interno. Para driblar o aumento de custos, a própria indústria passou a buscar fornecedores estrangeiros, montou fábricas no exterior e deixou mercados externos arduamente conquistados para vender aos consumidores brasileiros, que absorvem os preços mais salgados.
Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), levantados em parceria com a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), a indústria brasileira importou 22,4% dos insumos utilizados no ano passado, o maior patamar da série histórica, iniciada em 1996.
Em 2005, o percentual era de 17,2%. Em 2011, enquanto o Brasil teve um superávit de US$ 29,8 bilhões na balança comercial, a indústria de manufaturas teve déficit de US$ 92,5 bilhões.
O segmento mais afetado é a indústria de transformação, que ficou estagnada em 2011 (variação de 0,1%), enquanto a indústria crescia 1,6%, e o Produto Interno Bruto (PIB), 2,7%. Nos últimos dez anos, a indústria manteve a participação no PIB, com 27,5% em 2011, em comparação com 27,3% em 2000.
A indústria extrativa mineral aumentou sua fatia nesse período. Mas a indústria de transformação perdeu terreno, encolhendo de 17,1% para 14,6% no ano passado, o menor patamar em cinco décadas.
A indústria perdeu algum espaço também no conjunto do emprego e responde atualmente por 16% do emprego no país, percentual que estava ao redor de 17% até 2009.
O pior desse quadro é que o governo não parece seriamente envolvido em uma solução abrangente como a complexidade do quadro exige. As iniciativas governamentais têm mais se assemelhado a improvisos, medidas que não vão em frente ou ataques pontuais.
O Reintegra, por exemplo, que promete devolver ao exportador 3% do valor exportado por conta de impostos não recuperados, foi lançado em agosto no plano Brasil Maior, mas até agora não reembolsou nenhuma empresa.
O governo prefere tentar estancar a desvalorização cambial, mas muitas medidas adotadas acabaram criando distorções. Além de o câmbio não ser o único problema, esse é um caminho arriscado porque a desvalorização do dólar é um fenômeno global, desencadeado pela crise internacional e pelo afrouxamento monetário usado pelas economias avançadas para tentar reativar suas economias.
O problema precisa ser enfrentado em todas as suas facetas, levando em conta o novo cenário internacional de dólar fraco, capacidade ociosa da indústria global e intensa competitividade.
Editorial Valor Econômico
Reportagem publicada pelo Valor na segunda-feira revelou que um acúmulo de fatores mais e menos antigos conspirou para deprimir a indústria brasileira, especialmente o segmento de transformação, nos últimos anos.
Infraestrutura precária, custos elevados de mão de obra, carga tributária alta, spreads bancários turbinados em cima dos maiores juros do planeta e educação insuficiente são alguns desses antigos problemas que afloraram com toda intensidade quando a crise internacional acentuou a tendência de apreciação do real e aumentou a concorrência mundial.
Os custos da indústria brasileira vêm subindo continuamente. Conforme a reportagem registrou, a folha de salários da indústria aumentou 25% desde 2005 em reais, já descontada a inflação.
A energia elétrica, um importante indicador da infraestrutura, ficou 28% mais cara, apesar da abundância de recursos hídricos. Com a valorização do real, os custos tornaram-se ainda maiores. Em dólares, a energia saltou 86%, e a mão de obra, 57%.
Nesse espaço de tempo, o câmbio teve uma valorização de 40% em termos reais, frente a uma cesta de 15 moedas, que deixou a indústria brasileira com dificuldades de competir não só com a China, mas também com a Alemanha.
O impacto desses fatores na perda da competitividade da produção brasileira foi fulminante. Em 2004, a chapa de aço nacional tinha praticamente o mesmo preço da importada. Em 2011, o aço doméstico custava 75,5% mais do que sete anos antes e o importado subiu 38,2%.
O preço sem impostos da tonelada da chapa grossa de aço laminado brasileiro chegou a US$ 1.130 no ano passado, 31,9% mais cara do que a importada (US$ 857).
Em outro exemplo recolhido pela reportagem, o custo da mão de obra industrial no Brasil, de US$ 10,08 por hora, é um terço da verificada nos Estados Unidos e Japão, mas é maior do que a de países como o México, cuja indústria automobilística vem preocupando Brasília, e, naturalmente, do que o da China.
A produção industrial brasileira perdeu espaço não só no mercado externo mas também no interno. Para driblar o aumento de custos, a própria indústria passou a buscar fornecedores estrangeiros, montou fábricas no exterior e deixou mercados externos arduamente conquistados para vender aos consumidores brasileiros, que absorvem os preços mais salgados.
Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), levantados em parceria com a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), a indústria brasileira importou 22,4% dos insumos utilizados no ano passado, o maior patamar da série histórica, iniciada em 1996.
Em 2005, o percentual era de 17,2%. Em 2011, enquanto o Brasil teve um superávit de US$ 29,8 bilhões na balança comercial, a indústria de manufaturas teve déficit de US$ 92,5 bilhões.
O segmento mais afetado é a indústria de transformação, que ficou estagnada em 2011 (variação de 0,1%), enquanto a indústria crescia 1,6%, e o Produto Interno Bruto (PIB), 2,7%. Nos últimos dez anos, a indústria manteve a participação no PIB, com 27,5% em 2011, em comparação com 27,3% em 2000.
A indústria extrativa mineral aumentou sua fatia nesse período. Mas a indústria de transformação perdeu terreno, encolhendo de 17,1% para 14,6% no ano passado, o menor patamar em cinco décadas.
A indústria perdeu algum espaço também no conjunto do emprego e responde atualmente por 16% do emprego no país, percentual que estava ao redor de 17% até 2009.
O pior desse quadro é que o governo não parece seriamente envolvido em uma solução abrangente como a complexidade do quadro exige. As iniciativas governamentais têm mais se assemelhado a improvisos, medidas que não vão em frente ou ataques pontuais.
O Reintegra, por exemplo, que promete devolver ao exportador 3% do valor exportado por conta de impostos não recuperados, foi lançado em agosto no plano Brasil Maior, mas até agora não reembolsou nenhuma empresa.
O governo prefere tentar estancar a desvalorização cambial, mas muitas medidas adotadas acabaram criando distorções. Além de o câmbio não ser o único problema, esse é um caminho arriscado porque a desvalorização do dólar é um fenômeno global, desencadeado pela crise internacional e pelo afrouxamento monetário usado pelas economias avançadas para tentar reativar suas economias.
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