05/09/2018

CICLO DE PALESTRAS SENGE: Pedro Celestino fala sobre o papel da Engenharia brasileira na saída da crise

O fundamental papel da engenharia para retomada do desenvolvimento econômico e social do país foi o tema de mais uma etapa do Ciclo de Palestras, ocorrida na noite dessa terça-feira (04). Com o tema “papel da Engenharia Brasileira na saída da crise”, a palestra da noite foi ministrada pelo engenheiro Pedro Celestino Pereira Filho, atual presidente do Clube de Engenharia no RJ.

A inciativa é realizada pelo Conselho Técnico Consultivo do SENGE (CTC), visando ampliar e aprofundar estudo sobre o fenômeno da uberização do trabalho, contextualizando e analisando sua repercussão sobre a sociedade e o mundo do trabalho. Ao decorrer da programação, o Ciclo de Palestras SENGE tem trazido assuntos como a financeirização da economia e do mercado do trabalho, a indústria 4.0 e tecnologia da informação, os aspectos do trabalho intermitente e sem vínculos, a Reforma Trabalhista e a precarização do mercado do trabalho, a desestruturação das fontes de financiamento da seguridade social, a ação corporativa e o protagonismo social e político dos sindicatos e o cooperativismo digital.

Nas edições anteriores, o Ciclo de Palestras SENGE já recebeu o economista Enéas de Souza, que tratou da financeirização da economia e do mercado do trabalho no contexto do geopolítico mundial; o professor do Instituto de Informática, Sergio Bampi, que falou sobre a internet das coisas, indústria 4.0, tecnologia da informação e suas implicações no mercado do trabalho; e o economista David Deccache, que palestrou sobre a crise estrutural do capital na economia brasileira e o fenômeno da uberização. Ludmila Abílio, que apresentou uma análise da nova forma de subordinação do trabalho chamada de ‘uberização’, que conta com o autogerenciamento do trabalhador enquanto empreendedor de si próprio, e Marilane Teixeira, com uma abordagem sobre o protagonismo sindical frente às mudanças tecnológicas e à Reforma Trabalhista também já passaram pela programação, que é aberta ao público e gratuita.

Engenheiro civil especializado em Transportes, formado pela PUC-RIO em 1967, Pedro Celestino preside a Internacional de Consultoria e Planejamento S.A. (ICOPLAN), empresa de engenharia consultiva com serviços realizados em quase todos os Estados brasileiros, desde 1975. É membro vitalício do Conselho Diretor do Clube de Engenharia. Representou o Clube no CREA-RJ por nove anos e na Federação Brasileira de Associações de Engenheiros (FEBRAE) por seis anos. Fez parte da direção da Associação Brasileira de Consultores de Engenharia (ABCE) por três anos. Foi membro do Conselho Diretor da Associação Comercial do Rio de Janeiro por dois anos. É o atual presidente do Clube de Engenharia, recentemente reeleito.

O engenheiro iniciou sua apresentação lembrando que em outra ocasião em que esteve no Rio Grande do Sul participou em conjunto com o Sindicato dos Engenheiros da elaboração da carta de Porto Alegre que, posteriormente, deu origem à carta de Maceió. O documento, que foi lido na abertura da palestra, destaca que a Engenharia é um os setores da economia mais afetados pela crise sendo estas as principais empresas afetadas, em processo que redundou no fechamento de milhares de empresas e no desemprego de pelo menos 100 mil profissionais.

E, assim como destaca a Carta de Maceió, no passado, foi com o desenvolvimento da Engenharia que o país cresceu, gerando oportunidades e desenvolvimento nunca vistos no país. Traçando um retrospecto das últimas décadas, Celestino lembrou que o desenvolvimento da indústria se deu principalmente pela necessidade de transporte: a geração de energia era uma necessidade para abastecimento de bondes. Não havia, àquela época, a necessidade de energia para indústria.  A criação do Estado moderno brasileiro veio na primeira Era Vargas, quando o presidente passou a criar departamentos domo o DASP, com o objetivo de organizar o funcionalismo que, até então, era su7jeito às trocas de governo e mudava a cada eleição, não tendo uma estrutura estável. “Criou departamentos para todas as áreas da economia, todas foram atendidas por essa preocupação de Vargas de organizar o Estado brasileiro, com uma visão de promover o desenvolvimento voltado ao interesse do nosso povo e não para o mercado externo – esse foi o papel de Getúlio no período 40-45”.

Nos anos seguintes, com a entrada do Brasil na guerra, desponta o aço no Brasil. Dispor de petróleo passou então a ser uma necessidade, um elemento essencial para a vitória em qualquer guerra. Foi instituído, então, o estudo do sistema de petróleo, e lançada a campanha “o petróleo é nosso”, como uma forma de dizer era necessário para que o Brasil fosse soberano.

Desde os primórdios do processo de crescimento da indústria brasileira, no entanto, havia quem defendesse a permanência do Brasil como o “celeiro do mundo”, arguindo quanto à vocação natural do país para a agricultura. O embate da industrialização versus a manutenção de um Brasil agrícola gerou tensões que se tornaram ainda mais agudas no segundo mandato de Vargas, quando criou o BNDE. Ficou claro que sem um banco, não haveria o investimento necessário para o estabelecimento dessas empresas estratégicas.

“A Engenharia antes de ‘30 era a engenharia liberal – havia alguns engenheiros, poucos, em pouquíssimas escolas, despenhavam as funções básicas ligadas à construção. A engenharia era uma atividade de profissionais liberais. Essa engenharia começa a ganhar corpo justamente quando se coloca essa visão do Estado, de que era necessário desenvolver energia e petróleo”, explicou.

Em subsequência, projetos importantes começaram a despontar pelo Brasil. Celestino citou, como exemplo, durante o governo Dutra, o desenvolvimento de um projeto elétrico de grande porte no interior do Nordeste, “quando não tínhamos aço, não tínhamos nada”, frisou. No momento seguinte, outras iniciativas surgiram em São Paulo – que à época tinha em seu comando um grande professor de hidráulica. “Então nós começamos a ter Engenharia, a princípio, com a ajuda de empresas externas, mas começamos a desenvolver uma técnica própria”, salientou, lembrando que, já na era de Juscelino, a meta síntese de governo era levar o Brasil para dentro. Com isso, propôs a instalação da capital em Brasília: “Brasília mobilizou uma engenharia em escala até então inédita. A minha geração assistiu à construção desse país encima desse modelo de desenvolvimento criado por Vargas, desenvolvido por Juscelino, obstaculizado pelo golpe e recuperado posteriormente. Foi com essa visão de Vargas –  empresas estatais fortes, complementadas por empresas de capital e multinacionais – que a nossa Engenharia se desenvolveu em uma escala extraordinária”.

Pedro Celestino lembrou também da trajetória das grandes as empresas de Engenharia no Brasil e da sua contribuição para o fomento à ciência e tecnologia desenvolvida no país. Quando criada a Petrobrás, só havia um curso de geologia, em Ouro Preto – “Como nós vamos descobrir petróleo se não tínhamos geólogos? A Petrobrás passou então a fazer concursos para enviar profissionais aos EUA, e a incentivar a criação de cursos no Brasil”, afirmou.

Como resultado, o Brasil adquiriu em curto espaço de tempo uma cultura geológica própria, técnica especializada, capaz de explorar o nosso território. “A Petrobrás foi um marco para o nosso desenvolvimento. Dez anos depois, a Petrobrás desenvolve finarias com projetos inteiramente nacionais”, ressaltou, lembrando ainda que, em relação à Embrapa, ocorreu algo semelhante quando a empresa mandou mil agrônomos e veterinários se especializarem nas melhores escolas da Europa e EUA.

“Em ‘64, quando Castelo deu o golpe, o Brasil era 56ª economia do mundo, absolutamente dependente de café. Nós éramos tão dependentes do café que quando geava em SP, gerava uma crise cambial”, lembrou o engenheiro contrapondo ao que hoje, a exportação de café ainda coloca o Brasil entre os maiores fornecedores do mundo, porém representando apenas 3% do PIB.

"Em pouco mais de 20 anos, nós, que não tínhamos energia, construímos o maior parque hidrelétrico do planeta, um sistema interligado, de características únicas, que nos garantem a energia elétrica mais barata do mundo. Essa é a nossa Engenharia, que se sofisticou extraordinariamente e passou a ser exportada." Pedro Celestino

A nossa Engenharia se desenvolveu com a construção do país. E era muito mais ágil do que a que existia nesses países já desenvolvidos. Nesse processo, a nossa indústria ganhou muita força até que, na década de ‘80, veio o ápice. Depois, a década de 90 assiste à ascensão de forças neoliberais que propõem o estado mínimo, que propõem desmontar a era Vargas e reestabelecer o Brasil como celeiro do mudo. A primeira leva de privatizações consistiu em dar em concessão os sistemas de cargas do Brasil, todos privatizados para as grandes empreiteiras nacionais. Elas passam então a ter uma geração de caixa que as transformou em empreendedoras, e passaram a investir em gás, e outros segmentos estratégicos. Foi assim que as empreiteiras adquiriram enorme força política, e passaram a ocupar um espaço que antes era ocupado apenas pelo agronegócio e pelo capital financeiro – que no Brasil, é absolutamente parasitário, vivendo da dívida pública.

Então, essas três forças disputam o poder político no Brasil: a indústria, que estava perdendo espaço, os empreiteiros, que ganhavam expressão como empreendedores, e um terceiro grupo que é acumulador de capital o agronegócio. Até os anos ’60, o latifúndio era um grande inimigo do desenvolvimento brasileiro. O que acontece nos anos 2000, é que o governo Lula após a queda do Pallocci, muda a visão macroeconômica. O desempenho econômico do Brasil àquela época era medíocre e a mudança trouxe grande desenvolvimento social, especialmente em função do incentivo à agricultura familiar.

O agronegócio é o setor mais dinâmico da economia brasileira, e ainda é poupador de mão de obra. Assim, nós, que éramos um país essencialmente agrícola, com 60% da população no campo, em pouco mais de 20 anos, passamos a ter 80% da população na cidade, e criamos com isso um problema terrível. Então, essa política social de fomento à agricultura familiar ainda é um dos elementos de contenção social que nós temos.

E então, no momento em que a Petrobrás descobre o pré-sal –  que garantiria aos brasileiros sua soberania – nosso governo começa a ser atacado, afirmou Celestino. “O petróleo é um bem finito; e o petróleo do pré-sal é leve, e só a Petrobrás dispõe da tecnologia necessária para sua exploração, pois a exploração do mar requer conhecimento e tecnologia muito específicos. O Obama, à época, chegou a dizer que o Lula era o cara – o que aconteceu? O petróleo é o que nos daria independência – vejam vocês, os confrontos do Oriente Médio! No Brasil não há guerra, mas então o americano cria a quarta frota e começa a perturbar o nosso desenvolvimento” ressaltou o engenheiro, lembrando que esse choque entre desenvolvimentistas e os que olham para fora vem desde a década de 30, mas se tornou mais crítico com a descoberta do pré-sal e com a exclusividade da Petrobrás na exploração dos campos na área do pré-sal, que só tem produtividade menor que os campos na Arábia Saudita, com sucesso de 95%.

“A lava jato, sob a capa do combate à corrupção, que nos revolta a todos, se preocupou em destruir as empresas nacionais de Engenharia, em destruir a Eletrobrás que era símbolo da capacidade realizadora do nosso povo” frisou, ilustrando com o caso da Volkswagen que, envolvida em escândalos de corrupção, e inclusive multada por isso, não deixou de produzir um veículo sequer.

“Nossas empesas que disputavam o mercado internacional estão sendo dizimadas. Estamos regredindo à condição pré-trinta. O primeiro ato nesse sentido veio com a revogação da exclusividade da Petrobrás na exploração do pré-sal. Depois, a Petrobrás passou a fazer parcerias estratégicas com empresas internacionais, com que finalidade? Para passar o nosso conhecimento técnico e a nossa tecnologia, que nós construímos em sucessivos regimes e governos? Para serem destruídos de forma sistemática para que voltemos a ser meros exportadores?” questionou Celestino, que como representante do Clube de Engenharia, declarou-se defensor intransigente da soberania e da Engenharia. “Eu conclamo a vocês: nessas eleições, busquem candidatos que tenham compromisso com o que é nosso, candidatos que tenham compromisso com um país voltado aos interesses do nosso povo, socialmente inclusivo e democrático”, finalizou.

 

Assista aqui a íntegra dessa palestra! 


Relembre os eventos anteriores: 

16 de agosto

O PROTAGONISMO SINDICAL FRENTE ÀS MUDANÇAS TECNOLÓGICAS E À REFORMA TRABALHISTA

MARILANE TEIXEIRA – Economista e doutora em desenvolvimento econômico pela UNICAMP, pesquisadora na área de relações de trabalho, gênero e sindicalismo e assessora sindical. Veja aqui como foi e assista ao vídeo do evento.

 


31 de julho

O TRABALHADOR INTERMITENTE, O TRABALHADOR AUTÔNOMO E A UBERIZAÇÃO DO TRABALHO

LUDMILA COSTHEK ABÍLIO – Doutora em Ciências Sociais pela UNICAMP (2011); graduada em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP (2001) e mestra em Sociologia pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas da USP (2005). Veja aqui como foi e assista ao vídeo do evento.


19 de julho 

A CRISE ESTRUTURAL DO CAPITAL NA ECONOMIA BRASILEIRA E O FENÔMENO DA UBERIZAÇÃO

DAVID DECCACHE – Economista (UFRRJ) e Mestre em Economia pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Atualmente é assessor econômico na Câmara dos Deputados Federais e membro do Núcleo de Estudos em Economia e Sociedade Brasileira (NEB – UFF). Tem se dedicado à análise das causas estruturais da crise brasileira da década de 2010.Veja aqui como foi e assista ao vídeo do evento.


28 de junho

INTERNET DAS COISAS, INDÚSTRIA 4.0 E TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO E SUAS IMPLICAÇÕES NO MERCADO DE TRABALHO

SÉRGIO BAMPI – Professor e coordenador do Instituto de Informática da UFRGS, bacharel em Física, Mestre em Engenharia Eletrica Microeletronica, Doutor em Engenharia Elétrica – Microeletrônica (Stanford University, USA, 1986), com pós-doutorado pela mesma instituição. Veja aqui como foi e assista ao vídeo do evento.


10 de maio

FINANCEIRIZAÇÃO DA ECONOMIA E DO MERCADO DO TRABALHO NO CONTEXTO DA GEOPOLÍTICA MUNDIAL

ENÉAS DE SOUZA – Economista, com mestrado pela Unicamp, foi presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul – BRDE, diretor de Planejamento da Financiadora de Estudos e Projetos e secretário de Estado de Ciência e Tecnologia do RS. Foi do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) do Ministério da Justiça. Na palestra, o economista  falou sobre o enquadramento da dinâmica econômica mundial e nacional que está por trás da situação da precarização do trabalho em evento realizado no SENGE. Veja aqui como foi e assista ao vídeo do evento

 

PRÓXIMO CICLO DE PALESTRAS SENGE:


26 DE SETEMBRO (QUARTA-FEIRA), 18H

A REFORMA TRABALHISTA: PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO E COMPROMETIMENTO DAS FONTES DE FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL

JOSÉ DARI KREIN – Docente da Universidade Estadual de Campinas, possui doutorado em Economia Social e do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas (2007), mestrado em Economia Social e do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas (2000) e graduação em Filosofia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (1982). Tem experiência na área de Economia, com ênfase em Emprego, Relações de Trabalho, Sindicalismo e Negociação Coletiva. Professor do Instituto de Economia da Unicamp, Pesquisador e diretor do CESIT (Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho). Membro da diretoria da ALAST (tesoureiro) no mandato 2010-2013. Presidente da ABET (2007-2009). Membro da comissão de apoio à ABET no mandato atual, membro da GLU (Global Labor University).

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