Em um cenário que classificou como de “altíssima complexidade”, o consultor do Fórum das Centrais Sindicais, Clemente Ganz Lúcio, participou na quinta-feira (08) do “Seminário Internacional Movimento Sindical: Diálogos e Interações entre União Europeia, Espanha e Brasil”, realizado pelo SENGE-RS.

O evento abordou os desafios contemporâneos enfrentados pelo movimento sindical diante das profundas transformações em curso no mundo do trabalho.

O seminário também contou com a participação da representante da Confederación Sindical de Comisiones Obreras (CCOO) da Espanha, Cristina Faciaben, apresentando a experiência do movimento sindical espanhol na contrarreforma trabalhista ocorrida naquele país em 2021, e da desembargadora federal do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Brígida Barcelos, que abordou as relações de trabalho a partir da reforma trabalhista brasileira de 2017.

Comparando a atuação sindical atual a uma cirurgia cerebral de extrema complexidade, Clemente afirmou que o contexto sociopolítico, econômico e ambiental global impõe tarefas de grande proporção ao sindicalismo. “Estamos lidando com cinco tsunamis simultâneos que estão virando o mundo do trabalho de cabeça para baixo”, alertou o especialista.

Durante sua palestra, ele detalhou as chamadas “cinco grandes transições” que afetam diretamente a organização dos trabalhadores: a transição demográfica, tecnológica, ambiental, sociopolítica e econômica. Segundo Clemente, essas transformações abalam os fundamentos do pacto social e econômico construído no pós-guerra, baseado na democracia, na paz e no bem-estar social.

Demografia e tecnologia no centro do debate

A primeira transição destacada por Clemente é a demográfica, com o rápido envelhecimento da população e a consequente necessidade de repensar políticas públicas, o tempo de trabalho e os sistemas de proteção previdenciária. “O modelo previdenciário que conhecemos está colapsando. Nenhum jovem hoje terá os mesmos direitos que a geração anterior”, afirmou.

Já a transição tecnológica, marcada pelo avanço da inteligência artificial e da digitalização, está, segundo ele, promovendo uma reestruturação radical da produção e das relações laborais. “Estamos vendo jovens hiperconectados em trabalhos precários, enquanto empresas sonham até com a vida eterna artificial”, ironizou, citando investimentos em clonagem e reprodução digital de consciências.

Crise ambiental e ameaça à democracia

O consultor também alertou para a gravidade da crise ambiental e climática, enfatizando seus impactos sobre a vida nas cidades e o mundo do trabalho. “O que Porto Alegre viveu recentemente com as enchentes é só uma amostra do que está por vir”, disse.

Na dimensão sociopolítica, Clemente chamou atenção para o esvaziamento da democracia, a propagação de fake news e a ascensão de regimes autoritários. “A mentira virou política de Estado. A intolerância se instalou como regra e a democracia está sendo jogada no lixo”, afirmou.

Desigualdade e concentração de poder

Por fim, ele analisou a transição econômica, destacando o colapso dos acordos multilaterais e o avanço de estratégias de concentração de poder e riqueza. “Nunca a humanidade produziu tanta riqueza. E nunca essa riqueza foi tão concentrada”, afirmou.

Apesar do cenário adverso, Clemente defendeu que os sindicatos devem liderar a formulação de uma nova agenda para o futuro, pautada na igualdade, justiça social, sustentabilidade e cooperação. “Não podemos esperar que o mundo esteja resolvido para agir. A nossa tarefa é enfrentar essas ondas com visão política e histórica”, concluiu.

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