No Brasil, o sistema Robin Hood – de tirar dos ricos para dar aos pobres – está longe de ser realidade. A conta acaba por recair sobre a classe média. A constatação é da economista e pesquisadora no Programa de Políticas Públicas e Formação Humana da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), Ceci Vieira Juruá.
Nesta entrevista ao Engenheiro, ela é taxativa quanto à necessidade de uma reforma tributária que estabeleça alguns princípios mínimos de justiça fiscal. Entre as iniciativas nesse sentido, sugere refazer a tabela do Imposto de Renda e criar tributo sobre o patrimônio líquido das grandes empresas. Considera ainda essencial repensar o modelo brasileiro de crescimento e aprimorar os serviços públicos.
Você realizou um estudo sobre tributos e serviços públicos*. Quais as conclusões?
A conclusão básica é que a classe média não recebe em retorno, como serviços públicos, benefícios equivalentes ao que paga em imposto. Por outro lado, as transferências de renda para a população mais pobre, que são muito importantes e sou absolutamente a favor, são financiadas basicamente pela classe média. Nessa comparação, considerei à parte a questão da Previdência Social, porque é um gasto financiado com recursos dos contribuintes do sistema previdenciário em regime de transferências intergeracionais.
O “patinho feio” acaba sendo a classe média nessa história toda?
Nessa conjuntura neoliberal, a classe média é o patinho feio, porque inclusive um dos maiores benefícios que ainda tem do Governo, que é a universidade pública gratuita, está sempre ameaçada de extinção, cada vez que se fala em cortar gastos. E ela paga imposto de renda elevado, a alíquota marginal é muito alta, de 27,5%, para salários relativamente baixos.
Em princípio, o IR deveria ser calculado sobre a renda líquida, isto é, após descontados os gastos vinculados à sobrevivência social. Ora, cerca de R$ 3.700,00 como salário bruto, ou até mesmo deduzida a Previdência, é muito pouco para sustentar uma família de classe média (um casal e dois filhos na escola). Precisaríamos rever essas alíquotas de maneira a reduzir o peso tributário sobre sua renda.
Seria importante que houvesse cobrança de Imposto de Renda sobre dividendos?
Claro. E por que se diz que os ricos, que são uma parcela muito pequena da população, entre 1% e 5%, não pagam imposto no Brasil? Porque os rendimentos dessa parcela não provêm do trabalho, mas de comissões, de juros, ganhos no mercado financeiro e também dos dividendos, que estão excluídos do Imposto de Renda.
Qual o caminho para mudar isso?
Acredito que precisamos de uma reforma tributária que estabeleça alguns princípios mínimos de justiça fiscal. Isso envolve redistribuição de encargos e benefícios não só entre pessoas, mas também entre entes da Federação. Tenho certeza que esses assuntos são politicamente difíceis, mas é preciso enfrentá-los com muita urgência.
Em que deveria se concentrar essa reforma tributária?
Quanto aos impostos indiretos, existem alguns bens essenciais que são objeto de amplo consumo de massa e são tributados com alíquotas altas demais, por exemplo energia elétrica. Isso tem que ser reduzido, é muito que se pague sobre a conta de luz 33% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Do ponto de vista dos impostos diretos, que representam aproximadamente 1/3 do total de tributos arrecadados e 12% do PIB (Produto Interno Bruto), precisamos refazer a tabela do IR no sentido de reintroduzir alíquotas mais adequadas à renda da classe média e também rever as faixas de rendimento, além de criar o imposto sobre o patrimônio líquido das grandes empresas. Não vai reduzir substancialmente a concentração de renda, mas são recursos adicionais para que o Governo possa desempenhar com sucesso as suas funções de redução da pobreza e da marginalidade e aliviar o ônus tributário que recai sobre a classe média.
Garantir o repasse dos tributos que são pagos para incrementar e melhorar os serviços públicos passa pelo não contingenciamento para pagamento de juros?
Hoje no Brasil a questão dos juros e da dívida pública é importante e não se resolve por contingenciamento. Outro grande problema são as isenções tributárias e incentivos fiscais. Pelos últimos cálculos, são mais de R$ 120 bilhões que o Governo destina anualmente às empresas sob a forma de renúncia fiscal, isso tem que ser repensado, muitos desses incentivos provavelmente não são essenciais, não são necessários ao desenvolvimento.
Hoje o crescimento da economia está sendo pautado pelas exportações, e as companhias exportadoras estão isentas da maior parte dos impostos pagos por empresas que produzem para o mercado doméstico. Acho que esse modelo também tem que ser repensado, lembro que a Argentina utiliza impostos sobre exportação para melhorar o caixa do Governo, enquanto o Brasil dá incentivos demais e abre mão de uma parcela importante da receita.
Na verdade, o que está em jogo é o próprio modelo brasileiro de crescimento, que deveria ser baseado no mercado interno. Para o externo, seriam dirigidos apenas os excedentes ou aqueles produtos considerados estratégicos para que o País continuasse a ter importância no cenário mundial. Sem colocar em causa esse modelo econômico, tudo fica difícil.
Apresentação disponível em http://www.cntu.org.br/
Uma entidade forte, protagonista de uma jornada de inúmeras lutas e conquistas. Faça o download do livro e conheça essa história!
Quer ter acesso a cursos pensados para profissionais da Engenharia com super descontos? Preencha seus dados a seguir para que possa entrar em contato com você:
Para realizar a sua inscrição, ao preencher o formulário a seguir, escolha o seu perfil:
Informe o seu e-mail para receber atualizações sobre nossos cursos e eventos:
Se você tem interesse de se associar ao SENGE ou gostaria de mais informações sobre os benefícios da associação, preencha seus dados a seguir para que possa entrar em contato com você:
Para completar sua solicitação, confira seus dados nos campos abaixo: