Por José Luiz Azambuja
Chico Anysio foi um mestre ao utilizar a linguagem popular e deliciosamente divertida em favor da crítica contundente e criativa, técnica em que a cultura brasileira não encontra rival. Aproveitando um pouco do que ele nos deixou, podemos recorrer à metáfora e ao humor para tentar entender um pouco mais sobre a chamada “desindustrialização” da economia nacional, ora em andamento, e afirmar que nossa indústria subiu no telhado.
É possível afirmar metaforicamente que o processo chegou num patamar que na patologia clínica é chamado de “agudização”. Neste estágio, sintomas isolados, pequenos transtornos, as enxaquecas leves, dorzinhas aqui e dali com as quais convivemos anos a fio, evoluem para um quadro sistêmico, algo maior, muitas vezes enfrentado quando é tarde demais. O que eram apenas marolinhas hoje são nuvens pesadas a pairar sobre a Indústria Brasileira e é mais do que real a possibilidade de se transformarem numa tormenta tropical ou algo ainda mais devastador. Maremotos, terremotos, tsunamis, são termos que em economia deixaram de ser metáforas já que explicam a situação de forma literal.
O apoio e a participação no Grito de Alerta Contra a Desindustrialização, expõe a posição do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio Grande do Sul favorável à criação de uma Política Industrial consistente que ataque não apenas os sintomas, mas as causas da presente inanição. Resolver os gargalos estruturais, ampliar os tímidos investimentos em educação, reduzir a carga tributária e as tarifas de energia, acabar com a Guerra Fiscal, eliminar a falta de estímulo à inovação e promover urgentes melhorias dos processos de gestão, são providências urgentes para a reversão de um quadro crítico.
Só que a crise tem inúmeros algozes, alguns deles injustamente identificados. Outros vestem-se de cordeiros para comer a vovozinha.
A valorização do Real, por exemplo, resulta de uma política cambial liberalizante, que entre outras coisas, prega a não interferência do Banco Central na fixação das taxas, e mesmo que isso ocorra, acontece dentro de regras estabelecidas pelo mercado, ou seja, por quem tem dólares para vender e reais para comprar de acordo com suas necessidades e interesses. Vale lembrar a importância da liberação das importações no controle da inflação, só para citar um dos efeitos positivos da desregulamentação. Poderíamos citar os automóveis, as atrações e o custo benefício do turismo no exterior, mas seria covardia.
A China por sua vez é sempre relacionada como grande vilã. Mas se é verdade que explora uma parte de seus trabalhadores com jornadas e salários muito aquém da realidade brasileira, também é fato que outra parte tem aumentos constantes de renda e o país investe recursos gigantescos nas áreas de educação, ciência, tecnologia, inovação, produtividade e qualificação profissional. Isso sem falar nos esforços pessoais de centenas de milhões de seus cidadãos revelados ao ocidente diariamente nos noticiários e programas de economia, esportes, artes e variedades.
Por aqui, o processo de desindustrialização iniciou faz tempo, atingindo inicialmente setores específicos, como no caso do Rio Grande do Sul, a indústria de calçados, a vinicultura, móveis, entre outros. Em Santa Catarina a vítima inicial foi o setor têxtil. Mas precisou que o quadro se agudizasse para que cada um dos agentes produtivos deixasse de olhar apenas para seu umbigo moribundo e passasse a pensar em soluções. Vale espernear, mas não espere grandes resultados desta estratégia.
Colhemos hoje os resultados de uma economia que favorece o consumo de forma desequilibrada, já que se encontra dependente em grande parte do aumento das importações e das facilidades de crédito, o que para o consumidor final é bom, ao menos em parte.
Esta situação coloca a indústria nacional contra a parede, já que escancara a falta de competitividade provocada por diversos fatores, entre eles nossos minimalistas investimentos em pesquisa, em qualificação profissional e inovação tecnológica, ações que no Brasil, de forma equivocada, parece ser uma tarefa apenas do Estado.
Outro vilão que merece julgamento justo: os impostos. Segundo dados da Receita Federal, nos últimos cinco anos o Governo Federal baixou medidas que desoneraram as empresas em cerca e R$ 100 bilhões, o dobro do que pretende investir este ano no PAC, e quatro vezes o custo do Programa Brasil Sem Miséria. Tais medidas resultam de esforços no sentido de enfrentar os efeitos da crise internacional que minou a competitividade da indústria nacional, e não de uma política estratégica de desenvolvimento. Valeria mais se as isenções ajudassem para baixar os preços ao consumidor, mas este efeito colateral não foi verificado de forma proporcional.
Além disso, a indústria nacional manteve-se durante décadas alimentando-se do crescimento do mercado interno, das exportações, do entredevoramento concorrencial, e das oportunidades do mercado de trabalho em demanda reprimida.
O próprio Custo Brasil, é outro vilão de peso, ainda por cima monstruoso e esquizofrênico. Tudo porque dizem ser tão feio em função da oneração das folhas de pagamento e da carga tributária, enquanto que, na verdade, assusta pelos baixos índices de produtividade e de capacidade de inovação. Quando tudo podia ser repassado aos preços ao consumidor, ou seja jogado para baixo do tapete, tudo era uma maravilha. Hoje o momento é outro, e a dona de casa não está nem aí se o azeite não é fabricado em Pelotas: ela quer apenas o melhor e, incrível, o melhor muitas vezes é mais barato, vide vinhos e automóveis.
Quando a coisa aperta, desoneração da folha salarial das empresas e política cambial são pautas que voltam à mesa, às manifestações de rua e principalmente aos releases. Pronunciamentos do próprio Ministro Mantega, contribuem para o agendamento destas questões. No entanto, seguem a política de apagar incêndio, que provoca efeito “localizado e temporário” segundo dados da Fundação Getúlio Vargas.
A solução seria um programa de médio e longo prazo de ataque aos problemas estruturais de competitividade, como destacou Armando Castellar da FGV, que salienta, no entanto, o fato de que se o Governo não tivesse agido, a situação estaria bem pior.
Alguns dados para reflexão, divulgados em editoriais do Valor Econômico (25/03/2012) e O Estado de São Paulo (24/03/2012):
(VE) A energia elétrica, um importante indicador da infraestrutura, ficou 28% mais cara, apesar da abundância de recursos hídricos. Com a valorização do real, os custos tornaram-se ainda maiores. Em dólares, a energia saltou 86%, e a mão de obra, 57%.
(VE) Em 2004, a chapa de aço nacional tinha praticamente o mesmo preço da importada. Em 2011, o aço doméstico custava 75,5% mais do que sete anos antes e o importado subiu 38,2%.
(VE) Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), levantados em parceria com a Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), a indústria brasileira importou 22,4% dos insumos utilizados no ano passado, o maior patamar da série histórica, iniciada em 1996.
(VE) A indústria extrativa mineral aumentou sua fatia nesse período. Mas a indústria de transformação perdeu terreno, encolhendo de 17,1% para 14,6% no ano passado, o menor patamar em cinco décadas. * (O que reforça o pais como exportador de matérias primas, que agregam valor no exterior e geram empregos e riqueza por lá, e retornam para cá como bens duráveis via importações cada vez maiores). * Nota do redator.
(VE) O problema precisa ser enfrentado em todas as suas facetas, levando em conta o novo cenário internacional de dólar fraco, capacidade ociosa da indústria global e intensa competitividade.
(OESP) Questões estruturais e modelos de gestão empresarial inadequados têm sobre a atividade industrial efeitos negativos muito mais profundos e duradouros e, por isso, mais nocivos do que a taxa de câmbio.
(OESP) Entre 17 países latino-americanos estudados pela instituição americana The Conference Board, o Brasil ficou na antepenúltima posição em produtividade do trabalhador, medida pela relação entre PIB e pessoal ocupado, de acordo com reportagem do jornal O Globo (18/3). O Brasil ficou à frente de Bolívia e Equador, mas atrás de Argentina, Chile, Colômbia, México, Venezuela e Peru, entre outros países latino-americanos.
(OESP) O índice brasileiro, neste caso, foi favorecido pela desvalorização do dólar e, por essa razão, mostra que a baixa produtividade do trabalho no País se deve a outros fatores (a valorização do dólar reduziria o PIB nessa moeda e, consequentemente, tornaria ainda mais baixo o índice de produtividade).
(OESP) Mesmo que aceitasse arcar com um custo social tão alto, dificilmente o Brasil alcançaria resultados econômicos tão rápidos. O aumento da produtividade do trabalhador brasileiro é limitado, entre outros fatores, pela defasagem nos investimentos em educação.
(OESP) Com escassez de trabalhadores qualificados, exigidos cada vez mais pelo mercado de trabalho, os salários de determinadas funções tendem a subir bem mais do que a produtividade média do setor, o que afeta o preço dos bens finais. Da mesma forma, o peso excessivo dos tributos e o preço elevado da energia, entre outros itens que compõem os custos industriais, reduzem a competitividade da indústria. Do lado das empresas, o nível muito baixo de investimentos em inovação mostra despreocupação ou desatenção com um dos fatores essenciais para a conquista e preservação dos mercados mais promissores da economia contemporânea.
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