19/06/2012

A ineficácia de medidas paliativas

Depreciação cambial, taxas de juros e desonerações não compõem um conjunto de medidas adequadas para atacar os entraves ao crescimento. O interesse do governo federal em impulsionar o crescimento econômico e em promover a retomada do dinamismo da indústria nacional é louvável. Contudo, tal estratégia tem sido pautada em medidas paliativas, que pouco contribuirão para alterar as condições de crescimento da economia brasileira, ainda que produzam efeitos de curto prazo não desprezíveis.

As ações do governo têm se concentrado em: desonerações (Programa Brasil Maior e medidas recentemente anunciadas para o IPI sobre automóveis), redução acelerada dos juros básicos e intervenção no mercado cambial. Essas três frentes podem, de fato, gerar efeitos positivos sobre a dinâmica da atividade econômica e, em particular, da indústria. Trata-se, entretanto, de efeitos de curto prazo, que nada têm a ver com os entraves estruturais à evolução mais robusta da oferta de bens e serviços.

No primeiro eixo de medidas, o tributário, o governo mostra falta de planejamento e ausência de clareza nas medidas adotadas. Os dados de arrecadação e as notícias veiculadas sobre o tema evidenciam que os setores não têm sido beneficiados integralmente, como preconizava o governo. A primeira versão do Programa Brasil Maior, que havia escolhido quatro setores para beneficiar, foi complementada pelo "novo" Brasil Maior, com a inclusão de mais setores da indústria e atacando o problema da tributação sobre a folha.

Propostas deveriam ser orientadas para melhorar as condições de crescimento, como qualificar a mão de obra

Estas medidas são importantes, mas deveriam ser horizontais, podendo dar algum fôlego à indústria. Entretanto, a complexidade das medidas e sua difícil implementação pelos setores beneficiados limitam os ganhos. As desonerações de IPI já se provaram limitadas para produzir alterações de maior fôlego. O espaço fiscal para todas as medidas, de fato, existe, mas não sem prejuízo à evolução do investimento federal, que poderia crescer com mais vigor se as receitas arrecadadas pelo governo fossem focalizadas nesse objetivo. Basta observar as taxas de execução do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), principal programa de investimentos do governo federal, para constatar que pouco tem sido feito nesta seara.
No segundo eixo, é fato que a redução da taxa real de juros estimula o investimento produtivo. Quanto menores os juros básicos, tanto maior o número de projetos de investimento produtivo que se tornam viáveis, mesmo com taxas internas de retorno não tão elevadas. Estudo recente da Tendências mostra que há importante correlação entre juros reais e formação bruta de capital fixo.

Não basta, contudo, o movimento dos juros, em si, mas a escolha de uma estratégia macroeconômica que condicione as expectativas dos agentes sobre a estabilidade e o crescimento da economia. A redução unilateral dos juros gera efeitos positivos de curto prazo, no campo fiscal, ao reduzir o custo médio da dívida e abrir espaço no orçamento para investimentos, por exemplo, mas, se não for sustentável, apenas serve para criar um ambiente de incerteza inflacionária. Isto é, um ambiente pouco propício ao surgimento de investimentos produtivos. A redução de juros, para ser efetiva em seu objetivo de estimular o investimento, precisa ser acompanhada de medidas estruturais, focadas na expansão da infraestrutura nacional e da produtividade dos fatores de produção.

O terceiro eixo, o cambial, também tem impactos sobre a indústria, uma vez que taxas cambiais mais depreciadas estimulam a exportação e tornam os produtos brasileiros mais competitivos. A questão é que o câmbio, sozinho, não conseguirá engendrar todas as soluções necessárias para compensar a baixa produtividade e a competitividade da indústria nacional. Mais do que isso, concentrar na depreciação cambial o equacionamento de tais problemas levaria à necessidade de uma taxa que, certamente, resultaria em pressões inflacionárias indesejáveis, dada a dificuldade em controlar o câmbio real.

Dependemos, sim, de investimentos em qualificação da mão de obra, em infraestrutura logística e, portanto, de medidas muito mais orientadas para a ampliação das condições de crescimento do que simplesmente da ação unilateral de depreciar o câmbio via intensificação das intervenções no mercado à vista e futuro. Tal política, inclusive, tem custos fiscais importantes, uma vez que a esterilização da expansão monetária gerada pela compra de dólares é feita pela própria autoridade monetária, por meio das chamadas operações compromissadas – cujo custo é de cerca de R$ 50 bilhões por ano, o equivalente a quatro orçamentos anuais do Programa Bolsa Família.

Em última instância, a avaliação é de que as medidas tomadas pelo governo são paliativas, com efeitos de curto prazo. Muitas vezes, a adoção de tais ações se faz necessária para estimular o crescimento e evitar a rápida deterioração da demanda. Na ausência de medidas estruturais, contudo, que superem a estratégia de "apagar incêndios" e permitam construir um efetivo programa de estímulo à competitividade e ao crescimento econômico, permaneceremos aprisionados à conhecida dinâmica do "voo de galinha".

Felipe Salto é economista pela EESP/FGV-SP, mestrando em administração pública e governo (FGV) e analista da Tendências Consultoria.

Fonte: Valor Econômico

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