30/08/2012

Quem calcula os custos do automóvel nas cidades?

Parece inacreditável, mas o alarme vem das montadoras de automóveis – as mais interessadas em vender seus produtos. Texto de Cleide Silva na edição de 13/8 deste jornal informa que o "excesso de automóveis (mais 80 milhões de veículos no mercado global este ano) já preocupa as montadoras no mundo" e por isso "o trânsito nas megacidades leva fabricantes a incentivar debate sobre saída para o caos".

Nesta mesma hora, o tema mal chega às campanhas para as eleições municipais no Brasil. E em São Paulo, embora documentos da Prefeitura mencionem a possibilidade de instituir a cobrança do pedágio urbano e haja até projeto a esse respeito na Câmara Municipal (Estado, 1.º/8), não há intenção concreta de avançar nesse rumo neste final de gestão.

Professor universitário especialista na matéria, trazido por uma das montadoras, o alemão Michael Schrekenberg impressionou-se com o caos paulistano e chegou a sugerir inspeções rigorosas de veículos para evitar quebras e interrupções no trânsito, controle das emissões de poluentes, ampliação dos acostamentos, criação de faixas exclusivas para carros com mais de uma pessoa, "trens para ligar regiões da metrópole às periféricas".

As soluções, entretanto, terão de ser rápidas. São Paulo já tem frota de mais de 7,2 milhões de veículos, dos quais 3,8 milhões circulam diariamente. E não há regras para motocicletas.

Este ano ficará na capital paulista grande parte dos mais de 3,6 milhões de veículos vendidos no País. O documento da Prefeitura que menciona o pedágio urbano em 233 quilômetros quadrados do centro expandido, com tarifa de R$ 1 (em Londres é de R$ 25), convive com outro da Secretaria de Transportes que prevê para isso investimento de R$ 15 milhões, assim como a construção de três garagens subterrâneas (na gestão municipal de Jânio Quadros, há décadas, foi prevista a construção de 12 garagens subterrâneas, mas só duas foram construídas).

Muito pouco para uma cidade onde a frota cresceu 3% (213,2 mil veículos) em um ano e para um Estado já com 23,5 milhões (1,31 veículo por habitante em São José do Rio Preto, 1,34 em Araçatuba, 1,39 em Ribeirão Preto, 1,41 em Jundiaí, segundo a CartaCapital em 31/7). Uma fila única dos veículos da capital teria mais de 20 mil quilômetros de extensão (Estado, 7/8), embora a rede viária local tenha apenas 17 mil quilômetros.

A cidade perde R$ 55 bilhões anuais com congestionamentos, diz a Fundação Getúlio Vargas. No segundo semestre do ano passado, eles atingiram 226,2 quilômetros em um dia. Este ano baixaram para 184,8 (Estado, 9/8). Tecnologias como GPS, imagens de satélites e outras são cada vez mais comuns entre motoristas.

Já os agentes municipais de trânsito só têm os próprios olhos para observar menos de 200 das 15 mil vias públicas (15/8). Apesar dos dramas, o Diário Oficial chegou a publicar texto desaconselhando o uso de bicicleta (12/7), alternativa que só cresce em tantos países.

Também fora daqui, a China – que já tem problemas graves com trânsito – implantou 20 mil milhas de vias expressas e 12 rodovias nacionais. Só em Xangai foram 1.500 milhas. Não por acaso, o país já é o maior produtor de carros.

E sabe que até 2025 terá de pavimentar 5 bilhões de metros quadrados de rodovias (Foreign Policy, 17/8); até 2025, nada menos que 64% de sua população estará nas cidades (48% em 2010); 22 cidades terão mais de 1 milhão de habitantes. Sua frota de veículos poderá subir para 600 milhões em 2030.

Hoje 70% do espaço público já é destinado ao transporte (há poucos anos a Associação Nacional de Transportes Terrestres mencionava 50%), embora apenas de 20% a 40% dos habitantes usem automóveis.

As estatísticas do estudo dizem que 38,1% dos deslocamentos diários nas regiões metropolitanas brasileiras são feitos a pé; se forem considerados trajetos feitos em até 15 minutos, os deslocamentos sem automóveis sobem para 70%. Nas regiões metropolitanas como um todo, os deslocamentos em automóveis situam-se em 27,2%; em coletivos, 29,4%; a pé, 38,1%; em motos, 2,5%.

E o transporte público no Brasil está em 50% do total, enquanto na Europa chega a mais de 80% (mas nos Estados Unidos a apenas 5%).

Outra conseqüência nefasta da ocupação do espaço público pelas estruturas viárias – avenidas, túneis, viadutos, etc., nas áreas centrais -, diz o documento, é forçar os habitantes a mudar-se para outras áreas habitáveis, o que, por sua vez, gera a necessidade de urbanização dessas novas áreas – com a pletora de custos que isso implica.

Das questões globais (aquecimento) às econômicas, sociais (injustiça com os setores sociais mais desfavorecidos e taxados pesadamente pelos custos), culturais, fiscais (isenção ou redução de impostos para veículos, sem nenhuma contrapartida), etc., tudo está envolvido nas questões do transporte, já que mais de 80% da população brasileira hoje é urbana.

Não precisamos esperar que o drama se agrave, com a frota atual de veículos no País passando dos 37 milhões atuais para 70 milhões no fim desta década. Por mais complicada que seja, essa é uma tarefa para hoje.

Até as montadoras de veículos já sabem disso.

Jan Gehl defende a valorização de espaços para o trânsito de pessoas

Em entrevista à Revista Veja, o urbanista Jan Gehl fala sobre o poder que as intervenções urbanas têm na criação de novos hábitos e comportamentos na população. No passado distante, os urbanistas se debruçavam, primeiro, sobre a demanda das pessoas, depois refletiam sobre os espaços públicos e, por fim, imaginavam os edifícios nesse cenário. Hoje, a maioria pensa antes de tudo nos edifícios, depois nos espaços em que eles vão brotar e, só no fim, nas pessoas que circularão por ali.

As grandes cidades de países emergentes cresceram rápido demais e de forma desordenada, acumulando gargalos de infraestrutura que impõem desafios gigantescos, o que torna mais urgente ainda uma reflexão sobre o hábito do automóvel. É o ponto de vista dos motoristas que tem determinado os contornos da maioria das cidades modernas, onde os projetos de mobilidade urbana tem se restringido à construção de viadutos e avenidas que, somados aos incentivos econômicos do governo, estimulam cada vez mais o uso de carros.

Mas, daqui para a frente, com o escasseamento do petróleo e a alta no preço do combustível, seremos forçados a mudar essa mentalidade e apostar para valer em transporte público e boas ciclovias. Nesse sentido, Gehl reforça a ideia de que cabe aos planejadores urbanos dar às pessoas o estímulo correto, com a volta de uma "escala humana" para o planejamento das cidades, valorizando espaços de trânsito de pessoas que tornem o ambiente mais agradável à população, e não aos carros.

O urbanista cita o exemplo de Nova York, onde a decisão de fechar a Times Square há três anos causou desconfiança, por ser o centro nervoso de cruzamentos de grandes avenidas. Hoje as pessoas passam mais tempo na região e se demoram justamente olhando as vitrines e comprando. As resistências sempre esmorecem quando os críticos percebem que sua cidade está mais acolhedora e agradável.

Copenhague também mudou radicalmente com a construção de uma extensa malha de ciclovias que oferece às pessoas segurança e conforto para pedalar. Os motoristas foram se habituando a essa estreita convivência com os ciclistas e hoje os respeitam exemplarmente. Hoje, 37% dos habitantes vão ao trabalho pedalando e estima-se que em 2015 será metade da população.

Londres segue esta tendência, cobrando uma taxa dos motoristas para circular pelo centro. Sozinha, essa medida foi capaz de fazer o trânsito cair 20%.

Informações do jornal Estado de São Paulo e Revista Veja

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